terça-feira, 3 de maio de 2011

Minha vidinha de cachorro!


Recebi este texto por e-mail e acho que vale compartilhá-lo


Minha Vidinha de Cachorro


Jamil Snege
Este texto foi psicografado, por isto é importante que eu me indentifique logo como seu verdadeiro autor. Meu nome é Tarugo — e não me perguntem por que me botaram esse nome. Nós, cães, não costumamos contestar os nomes que recebemos. Puseram Tarugo, eu aceitei. Um nome é um nome, nada mais do que isso. Não faz a menor diferença. É apenas uma necessidade que os humanos têm de dar nomes às coisas, desde que começaram a falar. Substituir a coisa por um som — não é uma tolice? Nós, da comunidade canina, temos um método muito mais eficiente. Isto mesmo: uma cheiradinha. Um nome olfatitvo. Basta contornar o companheiro, chegar por trás e snif! — já identificamos o cara. Se os humanos fossem realmente espertos, usariam o mesmo método. Mas eles acham que não ficaria bem. Já imaginou — dizem eles — o governador receber a visita de um representante estrangeiro, contornar e...?

Tudo bem. Deixemos pra lá essa questão de nomes. O que me trouxe aqui, em espírito (vocês já devem ter notado que sou um cão falecido), é uma questão muito mais séria. Eu quero denunciar a tremenda injustiça que os humanos estão fazendo conosco. Se o cão é o melhor amigo do homem, a recíproca nunca foi tão falsa como agora. Vamos aos fatos. Vocês viram alguma notícia na impresa de cães agredidos, feridos ou mortos por seres humanos? Nunca. Vocês vêem exatamente o contrário. Cães agredindo. Cães mordendo as canelas de velhinhas indefesas. Cães atacando garotinhos angelicais. Cães perversos. Feras asassinas pondo em risco a sobrevivência da humanidade.

Eu que morri aos três anos, sem nunca ter abocanhado um glúteo, posso muito bem me insurgir contra esta descarada hipocrisia. O que vocês estão fazendo conosco é uma verdadeira cachorrada. Começa que somos numericamente inferiores a vocês. Um cão para cada sete pessoas, dizem as estatísticas. E já que falamos em estatísticas, sabe quantos cães foram mortos nas ruas somente no ano passado em Curitiba? 5.730. Isso mesmo: cinco mil, setecentos e trinta cães. Vítimas de atropelamento, envenenamento e outras crueldades maiores. Algum vereador propôs qualquer medida pra reduzir essa catástrofe? Ao contrário: propuseram o uso da focinheira. Não nos humanos, mas em nós. Só quem nunca foi cachorro pode aprovar uma barbaridade dessas. Cachorro não tem glândulas sudoríparas, como outros animais. Cachorros não podem suar, como suam vereadores. Nós precisamos abrir a boca e botar a língua de fora para controlar a temperatura do corpo. Não é para fazer gracinha, não, nem para cativar eleitores...

Mas deixem eu contar minha história. Eu era um cachorrão bonito, pêlo marrom, curtinho e brilhante. Minha mãe era boxer, meu pai era fila. Puxei mais o meu pai e muita gente me confundia com um fila de verdade. Até os dois anos e meio tudo correu bem. Eu tinha uma casa, uma família e uma tigela de ração bem cheia. Disciplina militar: meu dono era capitão, gostava de ser obedecido. E eu obedecia, principalmente quando havia visitas. Ele ficava todo orgulhoso, não da minha obediência, mas da sua capacidade de comando. Eu, generosamente, deixava que ele colhesse os aplausos. Tenho impressão que no quartel as coisas eram um pouco diferentes. Mas vamos lá. Um belo dia, o capitão anunciou que ia ser transferido. Embrulha, encaixota, embala — sobrei eu. Resolveram me dar para o jardineiro. Amarga experiência. Não sei se alguém de vocês já foi cachorro de jardineiro. É horrível. Você não pode fazr buraco, deitar nos canteiros, rolar no gramado. Se uma planta secar, foi você que mijou nela. Não agüentei. Fugi. Mas não tive nem tempo de me arrepender. A famigerada carrocinha me pegou e lá fui eu trancafiado para o Canil Municipal. Nunca imaginei que houvesse tanto cachorro na cidade. Celas superlotadas, pulgas aos milhares, companheiros que nunca tomaram um banho na vida. Voltando às estatísticas: dos 4.271 cães que a Prefeitura capturou no ano passado, só 1.485 voltaram para os braços de seus donos ou arranjaram uma família adotiva. O restante dançou: 619 foram doados para instituições de ensino e pesquisa (bisturi, extração de órgãos etc) e a maioria, exatamente 2.167 cães, foi sumariamente eutanasiada. Gostaram do verbo? Pois é como else dizem lá: eutanasiar. Matar sacrificar, exterminar são termos muito duros. Eles preferem eutanasiar. Não preciso dizer que fui um dos eutanasiados. Me agarraram, prenderam uma borracha ao redor do meu focinho e — doída, miseravelmente ardida — me aplicaram uma injeção de sal amargo. Morri feito um cão, as pernas amolecendo, a cabeça pesando, um calorão desgraçado exlodindo dentro do peito.

(Assim termina o protesto de Tarugo, o Breve, que jaz sob toneladas de lixo no Aterro Sanitário desta mui ecológica e humana Cidade de Curitiba, amém.)

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